...esperando que você me leia
Sou pista vazia esperando aviões.
Vander Lee
Rosana era uma menina que adorava aviões, desde cedo aprendeu a desenhar e criar os seus. Ela se dedicava como a uma obra prima e sempre que ia brincar algum coleguinha pedia o caprichoso aviãozinho de papel. Ela passava maior parte do tempo criando os aviões do que propriamente brincando com eles. E foi certo de que naquela comunidade a menina ficou conhecida como a melhor desenhista e criadora de aviaozinhos de papel, não havia menino que conseguisse superar tanto capricho.
Já mocinha despertou o desejo de ingressar na força militar, ela desejaria ser piloto da aeronáutica. Quando toda ouriçada foi contar aos pais, donos de uma pequena mercearia local, sobre seu sonho eles se entreolharam preocupados e se espantaram com a "maluquice" da filha.
- Oxi Rosana mas que idéia mais doida é essa e quem é que vai querer casar com uma pilota? Perguntou a mãe com as mãos na cintura, enquanto o pai só olhava.
- Mas mainha quem foi que falou pra senhora que eu quero casar? Quero mesmo é voar não sabe? Falou a menina com os olhos brilhantes como vagalumes que incandeiam no sertão.
- Deixe de coisa menina que já tá é na hora de você crescer e se não quer casar vai é estudar pra ser "dotôra" que filha minha tem que me dá é orgulho. Mas quem já viu, hunf! Ser pilota...
Dias seguiram e Rosana não tocou mais no assunto, já não sentia ânimo de criar ou de desenhar aviões, fora proibida de matutar esse assunto. Pouco tempo depois a menina foi enviada pelos pais a cidade grande, que a custo economizaram para pagar uma boa faculdade de medicina. Já estava decidido Rosana só voltaria a cidade depois de formada, as influências dali não lhe traziam boas idéias.
E como já era de se esperar depois de alguns anos Rosana voltou, agora mulher formada com seus vinte e seis anos. Voltara doutora para orgulho dos pais.
- Ave Maria e não é que a minha menina voltou. Correu a mãe ao encontro de Rosana
- Eita saudade danada filha. Falou a mãe enquanto chorava e soluçava ao mesmo tempo
A moça que era só riso também se emocionou ao ver a mãe, agora apresentando um pouco mais de rugas pelo rosto.
Não demorou muito o pai soube da notícia e foi ao encontro delas e antes de abraçar a filha caiu num pranto só, enxugando o rosto entre suor e lágrimas.
Já em casa os três partilharam da janta preparada especialmente para a filha. Macaxeira com charque e tomate, seu prato preferido.
Na cidade não se falava de outra coisa
- Vocês viram a filha dos Costa? Voltou da cidade e parece que é "dotôra", vai ser a médica do posto de saúde. Quem imaginava né? A menina só falava em avião. (E caíram na gargalhada)
- A Antônia foi é sabida, de enviar a filha pra cidade aqui ela ia era embuxar de um zé ninguém.
- Eita que vocês são é muito fofoqueiras, eu tô é feliz que agora a gente vai ter uma médica no posto e ainda sendo Rosana, moça prendada igual ela não conheço.
Em pouco tempo a "poeira baixou" e a comunidade voltou ao seu ritmo. Rosana adaptada a sua profissão atendia todos com muito zelo.
Mas vocês podem perguntar e o sonho de voar?
Ela voava sim, as pessoas não sabiam exatamente porque a dotôra Rosana se demorava tanto com as crianças, ali ela se misturava com eles, criava seus aviões, ensinava as crianças a fazer os seus próprios com pequenos pedaços de papel. Não existia limite em uma simples consulta.
E como em um sonho ela refez o seu, se especializou em pediatria e rapidamente foi convidada a trabalhar em hospitais de grande porte próximo da sua comunidade. Rosana se dividia entre o amor pela sua terra e pelo prazer que era atender crianças vítimas das mais severas patologias. Ali enquanto eles voavam com Rosana não existia câncer, não existia HIV, não existia maus-tratos, não existia dor.
As vezes a gente abre mão passivamente dos nossos sonhos, mas quem foi que disse que a gente não pode sonhar outra vez?
Beijo grande pra vocês!